quinta-feira, 2 de abril de 2009

Antítese da desilusão

Começou mal o dia. Com o despertador a tocar, consecutivamente, e comigo a ignorá-lo, a suspirar por mais uns minutos de sono e de sonho. Levanto-me, obviamente já atrasado, lento e desordenado. Enfio a roupa e os sapatos e um café que me queima o palato e saio de casa, com os minutos a passarem à velocidade do Bolt.

Vá lá, ainda assim correm eles mas consigo não correr eu. Hoje, pelo menos.

Entro no comboio com o humor ainda em baixo. O quente do Sol não compensa as músicas batidas que saem dos fones do costume. Nem os cabelos em pé nem as "Gola" a tiracolo nem os recém-redescobertos Ray Ban enormes, à moda dos polícias dos States de há 30 anos atrás.
Tão únicos e tão diferentes mas, afinal, tão formatados e tão iguais...

Para a música deles já tenho antídoto. Ligo também o meu, com som suficiente para bloquear quase todos os outros em redor, e tiro o livro. Neste momento, "Tournée", do Gonçalo Cadilhe. Para alimentar o meu desejo de estrada com as estradas percorridas por ele...

A viagem decorre sem grandes incidentes, embalada nas palavras lidas, na música e na quietude de um calmo e costumeiro companheiro de banco, este sem abanos nem safanões nem cotoveladas. Até à fatídica estação em que me calha o pior pesadelo imaginável numa carruagem: escola primária on tour! Entram mais e mais, em catadupa, uns atrás dos outros. E sem aviso, ainda antes de eu pensar "Oh meu Deus, dá-me paciência, salva-me daqui", começa a tocar Foo Fighters, "Echoes and Silence, Patience and Grace". Tudo tão em sintonia, com um timing tão perfeito, como se estivesse coreografado e ensaiado, nuns breves segundos o resumo de toda uma viagem. Enquanto o Cadilhe descreve o "Estão felizes e eu também", depois de uma viagem de horas num camião atulhado de gente, por África acima, cheia de curvas e apertos e fome, e de cânticos e de partilha e de essência humana.

E não pude, não fui capaz, de reprimir um sorriso (largo, aberto...) enquanto olhava para aquela pequenada toda, para os seus olhos brilhantes de entusiasmo, para os seus risos e para a sua alegria tão pura e tão revigorante, enquanto continuava a ouvir "Echoes and Silence, Patience and Grace"...

1 comentário:

Anónimo disse...

Também alimentam a vida, coisas destas, pequenas...